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(Reprodução/Divulgação) |
Blog
Alberico Cassiano
Surubim nunca viveu uma manhã tão conturbada
quanto a do sábado, 21 de fevereiro de 1987, dia da movimentada feira da cidade.
O advogado Evandro Cavalcanti seguia a pé para o
Sindicato dos Trabalhadores Rurais, onde, religiosamente, todos os sábados,
atendia aos produtores rurais que precisavam de apoio jurídico. Seguia
acompanhado da mulher, Jucilete, e pela filha Andréa, de apenas 11 anos.
No sindicato, cerca de trinta posseiros das
fazendas Umari e Cruzeiro da Caiana, duas áreas de conflito, o aguardavam.
Evandro Cavancanti iria anunciar aos agricultores que tinha conquistado, na
Justiça, o direito à posse das terras da Fazenda Umari. Mas não teve chance. No
meio do caminho, tinha uma Brasília branca e três homens armados.
"Doutor Evandro", teria dito, de acordo
com testemunhas, um deles, se aproximando do advogado.
"Diga companheiro", foram essas as
últimas palavras ditas por Evandro Cavalcanti, que mal se virou para olhar,
e foi imediatamente atingido por oito tiros, praticamente à queima roupa.
Morreu no local, na avenida Oscar Loureiro, uma das mais movimentadas da cidade.
"Eles ainda passaram na brasília, em marcha
lenta, como se quisessem ter certeza da morte dele", declarou em
depoimento, a esposa Jucilete Cavalcanti.
Ainda em depoimento, 'Leta', como é chamada,
declarou que " Evandro atuava em duas ações contra os proprietários das
fazendas Umari e Cruzeiro da Caiana, e apesar de todas as ameças, não
demonstrava medo e nunca andou armado ", declarou.
CULPADOS - os fazendeiros Charles Guerra de Farias e José do
Rêgo Neto, e um amigo deles, Severino Sinval Leal de Farias foram apontados
como os mandantes do assassinato.
De acordo com as investigações policiais, os
soldados da PM da Paraíba Francisco Rodrigues de Souza, o 'Trovão', Betânio
Carneiro dos Santos, e o PM reformado Valdeci Benício de Sá, de Campina Grande,
foram contratados para executar o crime. Foram presos e condenados a 18 anos de
prisão.
Os agenciadores também foram presos. Domingos
Gonçalves, o 'Domingão', de Limoeiro, foi julgado em 1993, mas em dezembro de
1997, estava em liberdade condicional, aos 68 anos. O ex PM Gildo Soares foi
julgado em 1998, também condenado a 18 anos de prisão, conseguiu liberdade
condicional anos depois.
Já Severino Sinval conseguiu habeas corpus e ficou
em liberdade. Morreu de doença degenerativa no Recife. Os fazendeiros Charles
Guerra de Farias e José do Rêgo Neto foram condenados à revelia e nunca foram
presos, eram considerados foragidos, mas acabaram sendo assassinados longe de
Surubim.
"Jamais temi iniciativas arrojadas"
Evandro Cavalcanti se definia como um homem de
esquerda. Era admirador de Sartre e de Fidel Castro. Nasceu em Surubim, no dia
12 de março de de 1949. A personalidade forte se revelou logo cedo.
"Já na escola, com cinco anos, ele brincava
de fazer discurso e as freiras ficavam escutando. Quando foi crescendo, logo
percebemos que ele tinha a mais forte personalidade entre os nove irmãos. Tinha
facilidade em expor o que pensava, defendia suas ideias e sempre foi muito
determinado", afirma a irmã e também advogada Nelma Cavalcanti.
Formado em Direito, advogou para o Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Surubim. Atuava como advogado de quatorze sindicatos
nos municípios do polo. Assegurou, na Justiça, o direito a posse da terra aos
agricultores da fazenda Tabu, a primeira área desapropriada pelo Incra no
agreste pernambucano para fins de reforma agrária.
"Depois vieram outras áreas, a exemplo das
fazendas Caiçara e Jundiaí, em Orobó, fazenda Salgadinho, Pá que vira, em Bom
Jardim, e finalmente, Caiana e Umari de Casinhas, sua última batalha. Evandro
incomodava muita gente. Ele trouxe vitalidade ao movimento sindical, mobilizou
e resgatou a autoestima do homem do campo", lembra o sindicalista Israel
Crispin.
Evandro Cavalcanti ingressou na vida pública em
1974, quando participou ativamente da fundação do MDB em Surubim e da campanha
de Marcos Freire para o senado.
Foi o segundo vereador mais votado nas eleições
gerais de 1982. Teve o mandato voltado para defesa das causas populares,
sobretudo pelas questões agrárias.
"Durante toda a minha vida pública, neste município, meu
compromisso é com a luta popular. estou consciente que valorizei os votos que
foram dados a mim. Jamais temi iniciativas arrojadas. É hora destes tecnocratas
aprenderem uma lição muito simples: a de que o povo é sábio. Somente ele, o
povo, sabe melhor do que ninguém resolver os seus graves problemas que, na
maioria das vezes, requer as mais simples medidas possíveis", afirmou Evandro em discurso na Câmara de Vereadores
de Surubim.
Em 1976, disputou a prefeitura e, embora não
tenha conseguido se eleger, obteve 46% dos votos. Em 1986, candidatou-se a
deputado estadual e teve quase dez mil votos.
Além da mulher, Evandro deixou quatro filhos:
Andréa, Marcela, Luís Neto e Fidel.
O Sindicato dos Trabalhadores Rurais vai lembrar
os 30 anos da morte do advogado e sindicalista Evandro Cavalcanti, com uma
missa na fazenda Tabu, celebrada por mais de vinte padres, no próximo dia 23.
Por Sérgio Ramos/Radialista e Blogueiro – 21/02/2017
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