A Visita em Agosto no Teatro Rui Limeira Rosal

Quando iniciei o processo de revelar para o mundo o universo deste António, mesmo estando e convivendo com a desertificação social, humana, arquitectónica, em vilas e povoados no Norte de Portugal e na fronteira com a Espanha, nunca deixei de pensar no Nordeste do Brasil, nos sertões que tanto conheço e onde a minha memória e identidade ainda se encontram ancorados. Aos poucos fui sentindo que toda essa desertificação significava muito mais que o doloroso vazio humano, que não era apenas um deserto de gente o que se estava a provocar, sim, digo provocar! pois o esvaziamento dos campos, das vilas, das pequenas cidades é provocado por estratégias politicas e económicas, por interesses financeiros, por um sistema capitalista onde o homem como ser humano deixa de ser o protagonista da vida dando lugar ao protagonismo do consumo e nesse novo modelo, inventando pelos ganhos e lucros das grandes empresas multinacionais, se inventam outras necessidades, algumas que o próprio homem desconhecia necessitar para viver, se criam outros modelos de felicidade e satisfação que antes não sabíamos serem precisos para que pudéssemos viver e ser felizes. Foi nesse desenrolar do fio à meada que me fui apercebendo que o drama que eu estava a transcrever não estava limitado ao deserto de gente, mas sim a desertificação da própria identidade de um povo que, pouco a pouco, estava sendo obrigado a desaparecer e deixar de ser quem era.
Ao encontrar esta oportunidade, oferecida pelo ator Severino Florêncio, de trespassar a história de António na VISITA para o Nordeste, me senti reencontrando os caminhos dessa desertificação numa geografia humana, social, política e económica que também é preciso que seja mais uma vez denunciada. Sendo frutos de uma mesma identidade, sofremos os mesmos males. Esta história não pertence apenas a terra dos esquecidos em Portugal ou na Espanha, é de todos os povos que são abandonados e esquecidos, desertificados de gentes e almas, secados no abandono na essência das suas histórias, das suas falas, das suas memórias, dos seus cantares, dos seus sonhos das suas identidades.
A desertificação no Nordeste acontece todos os dias. Muitos foram os retirantes, cantados e contados nas proesias da literatura brasileira, tantos que parecem ter retirado todos. Mais de 40 anos de mortes vidas severinas passaram, deuses e diabos secaram nas terras do sol e o sertão ainda não virou mar. Aos poucos fomos esquecendo de quem éramos, onde vivíamos, de onde viemos, os sonhos que um dia sonhamos e até das promessas que fizemos sob o luar do sertão, acabamos por esquecer tudo, como se tudo pertencesse a um distante passado ... A perda da identidade será o mal maior dessa desertificação e é por isso que necessitamos recriar os Antónios para que fiquem, voltem e nos falem das memórias que são a essência daquilo que ainda podemos voltar a ser. Acredito que este texto, agora definitivamente transposto para o Nordestinez, ganhará sentidos e significados renovados e poderá contribuir para que todos um dia, ainda possamos retomar a Visita que obrigatoriamente temos que fazer.
Moncho Rodriguez
O Grupo de Teatro Arte-Em-Cena, fundado em 1987, busca o aperfeiçoamento técnico, investindo na pesquisa do trabalho artístico de forma a proporcionar ao público, de tempos em tempos, espetáculos que traduzam a grandeza da arte. Possibilitando o acesso a obras literárias, a exemplo das montagem de: Quinze Anos Depois de Bráulio Tavares, Avatar de Paulo Afonso Grisolli, Dorotéia Vai à Guerra de Carlos Alberto Ratton, Diário de 1 Louco de Nikolai Gogol - adaptação de Rubem Rocha Filho, Romance do Conquistador de Lourdes Ramalho, Deus Danado de João Denys, e agora, A VISITA do encenador espanhol Moncho Rodriguez.
Desde o início de nossa trajetória visitamos, diversas vezes, as cidades de Caruaru, Arcoverde, Recife, Bom Conselho, Cabo de Santo Agostinho, Garanhuns, Palmares, Bezerros, Gravatá, Pesqueira, Belo Jardim e Petrolina, no Estado de Pernambuco, e Feira de Santana/BA, São Gonçalo dos Campos/BA, João Pessoa/PB, Campina Grande/PB, São José do Rio Preto/SP, Piracicaba/SP, São Mateus/ES, Guaramiranga/CE, Rio de Janeiro/RJ, São Paulo/SP e Valongo cidade do Porto em Portugal.Prometemos tornar fazer A VISITA a estas e tantas outras cidades... fica prometido... Que Santo Antônio nos guarde! Mas não nos esconda do mundo.

A VISITA - Sinopse 

Ao visitar o local que fez parte de sua infância, Antônio depara-se com um deserto de gente e de bicho. Na mais absoluta solidão, busca na memória recriar fatos de seu passado e através de relatos sobre a família, política e sentimentos, encher de vida o vazio do lugar e do seu coração.
 
Ficha Técnica
Texto: Moncho Rodriguez
Ator: Severino Florêncio
Direção/Figurino/Adereços/Maquiagem: Nildo Garbo
Mapa de Luz: Edu de Oliveira
Execução de Adereços: Naldo Fernandes
Execução de Figurino: Iva Araújo
Cenotécnico: Arnaldo Honorato
Fotografias: Marcos Nascimento
Design Gráfico: Moacir Silva
Produção: Severino Florêncio.

Vale apena conferir este monstro sagrado do teatro, o amigo Severino Florêncio, sem falar das outras feras envolvidas nessa produção a exemplo de Nildo Garbo.
 A Visita
Gênero: Teatro
Data: Todos os sábados de agosto de 2015, às 20h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal - SESC Caruaru
Ingressos: Inteira R$ 10,00 - Meia Entrada R$ 5,00
Fonte: Teatro Rui Limeira Rosal
Por Sérgio Ramos/Repórter e Blogueiro – 14/07/2015